Cacique Xicão: exemplo de luta do povo indígena Brasileiro

xicão tratado

“Numa faixa de terra de 28 mil hectares/ localizada no agreste pernambucano/ habitam cerca de 8 mil seres da espécie humana/. Eles não querem vingança/ eles só querem justiça/ querem punição para os covardes /assassinos de seu bravo Cacique Xicão” (“O Outro Mundo de Xicão Xucuru” – Mundo Livre S/A).

 

Nesse 20 de maio de 2016 completam-se 18 anos do assassinato de Francisco de Assis Araújo, o cacique Xicão. Líder do povo Xucuru, ele ousou enfrentar os interesses dos agropecuaristas, latifundiários e das grandes empresas que invadiam as terras já demarcadas, pertencentes aos nativos da região. A morte de Xicão foi encomendada pelos fazendeiros locais, mas não ficou impune. O exemplo de Xicão Xucuru continua vivo e sua memória ecoando na luta do povo indígena em todo país.

Os Xucurus habitam hoje a serra Ororubá, no município de Pesqueira, agreste pernambucano. Detalhe interessante é que a cidade foi fundada com a mesma ótica de invasão e massacre dos invasores europeus, em meados de 1659 com a chegada de “missionários” católicos. Não demorou muito para fazendeiros massacrarem os verdadeiros donos das terras, os expulsarem, assassinarem ou os tornarem seus escravos. Após viver uma diáspora, ora nas cidades vizinhas ou na periferia da cidade, os indígenas começaram a se organizarem para reconquistarem seu território, já que até seus cultos, como o Toré, foram proibidos e suas terras, consideradas sagradas para eles, tornada propriedade de invasores.

Em 1954 com o apoio do Serviço de Proteção ao Índio (SPI) – que era proibido de prestar seus serviços aos povos da região- os Xucurus foram reconhecidos pelo estado os verdadeiros donos da terra. Claro que isso não agradou em nada os fazendeiros da região e só acirrou a luta entre índios e invasores, obrigando também a organização popular por parte dos povos indígenas. Com a constituição de 88 outro salto foi dado: com muita organização e pressão, a questão do índio também foi observada, agora, com Xicão articulando a resistência, é eleito cacique em 1989, e em pouco tempo articula uma união das 23 aldeias em torno da luta pela terra, tornando-se referência em todo nordeste, Brasil e até fora dele. O ódio dos poderosos estava voltado contra ele.

Assassinado covardemente em 98, Xicão tornou-se símbolo de luta dos Xucurus e dos índios em todo o país. Hoje, quando os Xucurus vão celebrar seus ritos, gritam em seus cânticos por “Tamain” (sua deusa protetora), “Tupã” e cacique Xicão e seguem sua luta com Marcos Xucuru, filho de Xicão, como seu atual cacique.

 

 

Direitos dos índios ameaçados pelo governo golpista de Michel Temer

 

Porém, mesmo com todas as conquistas em torno das bandeiras de luta dos índios no país, ainda é gritante a impunidade e o desrespeito com relação aos verdadeiros donos do país, massacrados e apagados de nossa história política, cultural e econômica. Nesse sentido as recentes modificações no governo nacional também estão afetando os povos indígenas. Com o golpe dado pelo PMDB/PSDB/DEM apoiados pelos interesses do capital mundial, a nomeação de Blairo Maggi[1] para Ministro da Agricultura no lugar de Kátia Abreu (diga-se de passagem) que já começou dizendo que “não é justo acomodar índio e desacomodar uma família” [2]. Ele é defensor ferrenho da PEC 71/2011[3], que visa, entre outros atrasos, a indenização das famílias que “moram em terras declaradas indígenas”. A PEC, (já aprovada) é de autoria de Paulo Bauer, do PSDB, que já foi do antigo PFL, e também tem seu nome envolvido em diversos escândalos.

Mas, nada se compara a chamada 215/2000, apresentada por Almir Moraes de Sá (PR-RR) [4], tirada da gaveta pelo corrupto Eduardo Cunha, após muita mobilização do povo indígena ter engavetado há anos atrás. A PEC 215 prevê a retirada do direito à demarcação de terras indígenas e quilombolas, “retificando” as terras já homologadas, ou seja, roubando o que já tem estabelecido hoje, além do projeto de lei complementar 237 que visa permitir a exploração de terras indígenas e quilombolas para fins comerciais, de autoria de Homero Pereira (PSD-MT), um dos defensores políticos do agronegócio falecido em 2013.

A verdade é que esse retrocesso a que o Brasil foi entregue vai atacar a população indígena nacional diretamente (perto de 900 mil pessoas, segundo o ultimo senso do IBGE 2010). Inúmeras conquistas podem ser retiradas se continuarem a priorizar o agronegócio em detrimento da terra (sagrada para os índios) e da vida dessa minoria, até hoje não reparada pelos estragos causados pela exploração que aqui chegou e foi plantada e regada na força das armas.

Por tudo isso que o exemplo de Cacique Xicão torna-se tão vivo nesse emblemático 20 de maio de 2016, 18 anos de sua morte, uma data que motiva e alimenta ainda mais a sede por justiça e reparação do povo indígena. Pesqueira, por exemplo, ainda é o maior centro habitacional indígena do nordeste. Ao todo são mais de nove mil índios, vivendo na luta, resistindo contra todo tipo de invasão e com suas terras demarcadas dês de 2001, cumprindo as palavras de Zenilda Araújo, esposa de Xicão, no dia de seu enterro:

“A luta não vai parar. ele não vai ser sepultado; ele vai ser plantado, para quê dele nasça novos guerreiros”.

 

E a semente está dando frutos, e frutos de luta.

Viva a luta de cacique Xicão!

Viva a luta do povo Xucuru!

 

 

[1] Membro da família Amaggi, uma das maiores fortunas produzidas pelo agronegócio da América Latina, o “rei da soja”, como é conhecido o senador, já ajudou sua família a sonegar bilhões em impostos, além de outros escândalos;

[2] http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/economia/20160519/preciso-tirar-vies-ideologico-campo-diz-blairo-maggi/374745;

 

[3] https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/101237;

 

[4] http://www.cimi.org.br/pec2015/cartilha.pdf;